Sucesso nos salões, os estudos inspiram o estilo dos automóveis de produção, mas essa trajetória às vezes passa por trajetos conturbados
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Por que o Volkswagen Up não tem grade dianteira? De onde veio a inspiração para modelos ousados como o Citroën DS5, o Plymouth Prowler ou o primeiro Ford Ka? O que aconteceu para que carros como Chevrolet Agile, Hyundai Veloster e Pontiac Aztek chegassem ao mercado com linhas tão controversas?
As respostas dessas questões estão em uma mesma expressão: carro-conceito. São modelos de estudo, em geral revelados nos grandes salões internacionais, que servem de plataforma para testar a aceitação do público a ideias originais de estilo e tecnologia. O sucesso — ou fracasso — do conceito baliza, então, o fabricante sobre o que deve ser mantido ou modificado no projeto.
Essa estratégia tem-se desvirtuado nos últimos anos: em muitos casos a versão “conceitual” — como se constata, em geral, depois de seis a 12 meses — não passa do futuro modelo de produção com rodas maiores, faróis e lanternas mais ousados e outras pequenas diferenças. A ideia é criar expectativa no mercado pelo que vem por aí, sem entregar em definitivo os detalhes de sua aparência. A lista desse tipo de “falso conceito” ganha dezenas de modelos a cada ano.
Em outros casos, porém, o carro colocado no mercado acaba não tão parecido ao estudo por ter de atender a requisitos como espaço interno, praticidade de uso, segurança e custos que pouco importam na fase conceitual. A diferença tende a aumentar nos projetos de gestação demorada, aqueles que requerem cinco anos ou mais até o início de produção. Torna-se comum que o fabricante repense os padrões de estilo entre a apresentação do primeiro estudo e a chegada efetiva às ruas.
Nessas categorias estão os casos mais interessantes, alguns deles brasileiros. Selecionamos 100, dispostos em ordem alfabética. O conceito é sempre o da foto à esquerda.
Alfa Romeo Brera
O conceito de 2002 anunciava motor Maserati V8 de 400 cv e tração traseira, soluções que se perderam até o lançamento em 2005 e acabaram aproveitadas anos depois no 8C Competizione. O Brera de série saiu com um V6 de 260 cv e tração dianteira ou integral. O visual foi mantido em sua essência, mas foi preciso acrescentar uma janela lateral atrás da porta, sem a qual a coluna traseira larga criaria um grande ponto cego.
Aston Martin Rapide
Pelos quatro anos decorridos entre o estudo de 2006 e o modelo de produção de 2010, tudo indica que a marca inglesa não pretendia colocá-lo em linha ao desenhar o primeiro. Mas o fez preservando todo o charme de sua silhueta de cupê, de modo que é difícil encontrar uma diferença de estilo entre eles.
Audi TT
O cupê esportivo é um dos muitos carros que a Audi antecipou como conceito (antes houve o Space Frame de 1993, praticamente igual ao primeiro A8 do ano seguinte). O estudo de 1995 partiu de projetistas da marca em suas horas vagas, com alguma inspiração nos “Flechas de Prata” da Auto Union que batiam recordes de velocidade nos anos 30, e agradou tanto que foi colocado em produção em 1998. Ao desenho original foi acrescentada apenas a pequena janela lateral traseira, para maior visibilidade.
Audi Al2 e A2
O pequeno monovolume com carroceria de alumínio A2 apareceu em 1999 com linhas quase iguais às do conceito Al2 de 1997, mas uma falsa grade (na verdade não admitia ar) foi adotada na frente, talvez para manter a identidade da marca. A julgar por seu insucesso comercial, talvez a Audi fizesse melhor em deixá-lo apenas na fase conceitual.
Audi Pikes Peak Quattro e Q7
Volkswagen e Porsche estavam apresentando seus utilitários esporte Touareg e Cayenne quando a Audi mostrou, em 2003, o conceito Pikes Peak Quattro, que fazia alusão à prova de subida de montanha nos EUA. O motor era um V8 biturbo com 500 cv. Três anos depois, o terceiro fruto do projeto conjunto dos fabricantes ganhava as ruas como Q7 com sutis alterações visuais.
Audi Le Mans e R8
R8 era apenas o carro de competição da Audi na 24 Horas de Le Mans em 2003, quando o conceito Le Mans surgiu no Salão de Frankfurt, causando impacto com seu desenho futurista. Todo esse estilo, incluindo as “lâminas” laterais, foi mantido na versão de produção R8, apresentada em 2006. Curiosamente, o motor V10 com dois turbos e 610 cv do estudo nunca chegou a ser aproveitado.
Audi Metroproject e A1
Em 2007 a marca dos anéis revelou o estudo Metroproject, um hatchback bastante compacto. Três anos mais tarde era lançado o A1, que seguia as formas do conceito e mantinha o peculiar arco lateral em cor contrastante à da carroceria. Alguns itens mudaram de uma fase para a outra, como para-choque, faróis, grade e o recorte do capô.
Audi Cross Coupe e Q3
A história do A1 repetiu-se entre os utilitários esporte: o Cross Coupe do Salão de Xangai de 2007 antecipou o que se tornaria em 2011 o Q3, modelo menor que o Q5 (que ainda não existia quando aquele conceito foi revelado). Não foi preciso ir muito além de diminuir as rodas, trocar os faróis por outros menos futuristas e arrumar um lugar para a placa dianteira.
BMW Turbo e M1
Desenvolvido como demonstração de tecnologia para o período dos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972, o Turbo era diferente de tudo o que a BMW havia feito. Suas linhas imponentes inspiraram o primeiro superesportivo da marca, o M1, que chegou ao mercado sete anos depois. Mesmo que nenhum item de aparência seja igual entre eles, a semelhança é inegável. Irônico é que o M1 de rua nunca teve um turbocompressor como o que originou o nome do conceito.
BMW Z07 e Z8
Uma interpretação moderna do roadster 507 de 1955: esse era o Z07, revelado no Salão de Tóquio de 1997. O nome buscava unir o passado ao presente, pois já estava em linha o compacto Z3. Na linha 2000 a BMW estreava o Z8, muito parecido ao conceito, embora tivesse perdido a “dupla bolha” no teto removível (havia uma capota de lona), o prolongamento do encosto do motorista inspirado no Jaguar D-Type de corridas e as rodas com fixação central, enquanto luzes de direção e um defletor dianteiro foram adicionados.
BMW CS1 e Série 1
Um pequeno conversível previu, no Salão de Genebra de 2002, as linhas que a marca de Munique adotaria dois anos depois no Série 1. Só que ele nasceu como hatchback e precisou de quatro anos para ganhar sua versão a céu aberto, que então confirmou a semelhança com o conceito já distante no tempo. Em alguns aspectos o modelo de série foi menos ousado, talvez pela rejeição que vários projetos de Chris Bangle sofreram dos fãs da BMW durante seu período no comando do Estilo da empresa.
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