Soluções inteligentes aparecem na mecânica do sedã Toyota, que ganhou eficiência ao passar para álcool
Texto e fotos: Felipe Hoffmann
Decorrida metade do mês de avaliação, o Toyota Corolla XEi testado em Um Mês ao Volante passou a rodar com álcool na terceira semana. Foram 611 quilômetros de uso urbano com média geral de 10 km/l, que mostra que seu motor e o acerto de calibração da central eletrônica foram bem adaptados ao uso do combustível verde — confirmado pelos maiores índices de potência e torque em relação à gasolina, bem como pelos dados de consumo divulgados pelo fabricante conforme padrões do Inmetro.
Como mencionamos em outras avaliações, a relação de poder calorífico entre os dois combustíveis é de 66%, ou seja: se o motor trabalhar com a mesma eficiência, espera-se que na mesma condição em que o carro faz 10 km/l com gasolina o consumo seja de 6,6 km/l com álcool. Na prática, permite-se trabalhar com avanço de ignição mais próximo do ideal com o produto vegetal, o que no caso do Corolla fez a razão de consumo álcool/gasolina alcançar 68% nos testes da fábrica em cidade e 70% em rodovia.
Em nosso uso diário, no mesmo trajeto (com predomínio das marginais dos rios Tietê e Pinheiros, em São Paulo, SP) e com médias de velocidades parecidas, a razão ficou em 72%. Em outras palavras, nesse uso específico, o motor do Corolla é mais eficiente ao trabalhar com álcool, característica justificada pela taxa de compressão relativamente alta de 12:1. Interessante que com esse comportamento seu consumo médio com álcool se igualou ao do Honda Civic EXL de 2,0 litros — o qual não aproveita bem as vantagens do álcool, como apontamos em sua avaliação. Na média geral do trajeto costumeiro, ambos fizeram 10,5 km/l. O melhor consumo do Toyota foi de 11,1 km/l enquanto o rival fez 11,3 km/l, com velocidades médias de 35 e 36 km/h, na ordem.
No interior confortável do Corolla, insatisfação com a central de áudio: sem Car Play ou Android Auto, depende de aplicativo no telefone que não funciona
Por incrível que pareça, a caminho do fim do teste ainda estamos nos adaptando ao uso da central de áudio, que não se mostra prática no dia a dia, como ao sintonizar uma nova estação de rádio. Se você está numa FM na casa dos 100 MHz e quer sintonizar outra na faixa dos 90 MHz, passará por um exercício de paciência: ao pressionar mais tempo o botão para correr a frequência, os números somem e aparece o dizer “a procurar”, perdendo-se referência de onde se está. Quando se percebe, a rádio já passou. Não há opção de emudecer o som e o volume se movimenta muito devagar. Além disso o botão Power não desliga o aparelho, mas apenas o áudio — o navegador continua à mostra, o que pode atrapalhar à noite caso ele não esteja em uso. Há opção de desligar a tela, mas exige um caminho longo entre os menus.
Apesar de ser dotada de toca-DVDs e televisão digital, é frustrante não haver integração a celular por Android Auto ou Apple Car Play, hoje tão comuns no mercado, ou mesmo o controle do aplicativo Spotify na central. Quando se conecta o celular por cabo, aparece na tela “verifique se o Launcher App está instalado”. Ao pressionar “OK”, aparece “Inicie o app Connected Services no seu Iphone”. Tentamos descobrir no manual do carro o que isso significa, mas não há qualquer explicação. Na loja Apple Store, depois de um bom tempo procurando, encontramos o aplicativo de integração App Menu da Pioneer para carros da Toyota… que não funciona, atestado pelas várias opiniões negativas, algumas de dois anos atrás. Uma qualidade é não sair da rádio quando o navegador Waze indica algum caminho no celular conectado, inconveniente notado em alguns carros.
Por outro lado, na mecânica o Corolla adota soluções simples, mas engenhosas, que ajudam a Toyota na fama de carros duráveis, isentos de problemas e de fácil manutenção. Diz a lenda que os norte-americanos gastaram fortunas e tempo para desenvolver uma caneta capaz de escrever em gravidade zero, enquanto os russos simplesmente usavam lápis. No mundo do automóvel, podemos dizer que tal lenda se aplica aos carros alemães e japoneses, na ordem. Exagero? Basta se lembrar do complexo circuito de arrefecimento do VW Polo TSI, com resfriador de ar integrado ao coletor de admissão, que troca calor com o mesmo líquido usado para refrigerar o motor.
Prático porta-objetos central; lugares para a chave presencial no console e na lateral do painel; longarina mais externa que no Civic; hastes acionam tampa do porta-malas (abaixo)
Já os japoneses tentam simplificar ao máximo, o que reduz custos e a chance de problemas — embora, em certos conjuntos, essa metodologia resulte em falta de refinamento. Exemplo de algo simples e inteligente é a tampa do porta-malas, que usa braços convencionais (os famosos “pescoços de ganso”): em vez de molas helicoidais, que ocupariam mais espaço, a Toyota empregou hastes fixas que se torcem para fazer o papel de mola. Já a correia poli-V que aciona alternador, ar-condicionado e bomba d’água é tensionada por um parafuso no alternador. Vários fabricantes usam um esticador por mola ou que ajusta a tensão pela pressão de óleo do motor: não exige ajustes na correia, mas encarece tanto em peças quanto em mão de obra para trocar a correia.
Como na lenda dos lápis russos no espaço, os japoneses tentam simplificar ao máximo a mecânica, o que reduz custos e a chance de problemas
No caso do Corolla, uma conferida na tensão da correia e talvez um reaperto no parafuso são o suficiente, além de permitir que com uma simples ferramenta se troque a correia à beira da estrada em uma emergência. Também no motor, nota-se que a Toyota ainda circula líquido de arrefecimento pelo corpo de borboleta, tática comum em países de climas mais frios e na época de borboleta por cabo e atuador de marcha-lenta. Naquele sistema, a passagem do ar no referido atuador era muito restrita e se corria o risco de formação de gelo em temperaturas baixas com umidade alta, devido à depressão causada no local, afetando a marcha-lenta do motor.
Hoje tal sistema é pouco usado, uma vez que a passagem pela borboleta (que também controla a marcha-lenta) é bem maior, dificultando a formação de gelo no local — ou seja, eliminar o item no veículo brasileiro traria economia de produção, além de evitar aquecer o ar admitido. Também se notam os injetores de quatro fios, com preaquecimento de álcool nas partidas a frio. Tal sistema tem como função não só facilitar a partida sem um tanque auxiliar de gasolina, como também ajudar a reduzir o consumo e as emissões de poluentes. Aquecido, o combustível se vaporiza mais facilmente nessa fase delicada do motor, dispensando mistura ar-combustível muito rica.
Além disso, o sistema reconhece a mistura de álcool e gasolina que alimenta o motor e acelera a adaptação da central em caso de troca de combustível. Ao se abastecer o sistema entra em modo de adaptação, aquecendo o combustível encontrado no injetor. Como álcool e gasolina se comportam de modos diferentes durante o aquecimento, o sistema reconhece o que há no injetor. A maioria dos carros flexíveis usa para tal função a sonda lambda, a qual tem um tempo de retardo após a partida para a ativação. Por isso, muitos já tiveram dificuldade de partida após trocar de gasolina para álcool, manobrar o carro de frente da bomba até a loja de conveniência e voltar. Na partida após o enchimento ainda há gasolina na flauta que alimenta os injetores, mas ao movimentar o carro se troca de combustível antes de o sistema se adaptar.
A exemplo do Fiat Argo, no cofre do motor percebe-se a longarina superior bem externa, diferente da usada no Civic, que “alargou” a carroceria pelo para-lama. Quanto mais externa a longarina, maior será a chance de que ela atue em impacto frontal que pegue pequena parcela da frente do carro, trazendo segurança aos passageiros. No interior também há boas soluções, como um pequeno porta-objetos na frente do joelho esquerdo do motorista e, no porta-copos central, uma divisória em que a chave presencial se encaixa perfeitamente. A divisória pode ser colocada em três posições para se ajustar ao diâmetro da lata ou garrafa colocada no local. Já o porta-objetos central possui grande espaço e dois níveis.
Deixamos para a próxima semana os resultados de testes dinâmicos, ou seja, como se comportam motor, transmissão, suspensão e direção, com direito a análises dos dados do instrumento de medição Race Capture Pro.
Semana anterior
Terceira semana
Distância percorrida | 611 km |
Distância em cidade | 611 km |
Distância em rodovia | – |
Consumo médio geral | 10,0 km/l |
Consumo médio em cidade | 10,0 km/l |
Consumo médio em rodovia | – |
Melhor média | 11,1 km/l |
Pior média | 7,7 km/l |
Dados do computador de bordo com álcool |
Desde o início
Distância percorrida | 1.507 km |
Distância em cidade | 1.161 km |
Distância em rodovia | 347 km |
Consumo médio geral | 12,8 km/l (gas.) / 10,0 km/l (álc.) |
Consumo médio em cidade | 11,9 km/l (gas.) / 10,0 km/l (álc.) |
Consumo médio em rodovia | 14,4 km/l (gas.) |
Melhor média | 16,7 km/l (gas.) / 11,1 km/l (álc.) |
Pior média | 6,5 km/l (gas.) / 7,7 km/l (álc.) |
Dados do computador de bordo |
Preços
Sem opcionais | R$ 105.990 |
Como avaliado | R$ 105.990 |
Completo | R$ 107.740 |
Preços sugeridos em 19/7/18 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 80,5 x 97,6 mm |
Cilindrada | 1.986 cm³ |
Taxa de compressão | 12:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima (gas./álc.) | 143 cv a 5.600 rpm/ 154 cv a 5.800 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 19,4 m.kgf a 4.000 rpm/ 20,3 m.kgf a 4.800 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | automática de variação contínua, emulação de 7 marchas |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a disco |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 17 pol |
Pneus | 215/50 R 17 |
Dimensões | |
Comprimento | 4,62 m |
Largura | 1,775 m |
Altura | 1,485 m |
Entre-eixos | 2,70 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 60 l |
Compartimento de bagagem | 470 l |
Peso em ordem de marcha | 1.345 kg |
Desempenho e consumo (gas./álc.) | |
Velocidade máxima | ND |
Aceleração de 0 a 100 km/h | ND |
Consumo em cidade | 10,6/7,2 km/l |
Consumo em rodovia | 12,6/8,8 km/l |
Dados do fabricante; ND = não disponível; consumo conforme padrões do Inmetro |